A denúncia narra conduta consistente na publicação, através da rede mundial de computadores, na página pessoal do Facebook da denunciada, de dizeres de cunho discriminatório racial que, em tese, é típica, subsumindo-se ao crime previsto no artigo 20 da Lei 7.716/89, propagando seu sentimento “imbuído de severa ofensividade a uma coletividade – nordestinos –, transbordando o mero descontentamento político”…
A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) deu provimento a recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal (MPF), contra decisão proferida pelo Juiz Federal da 5ª Vara da Seção Judiciária do Estado de Goiás, que rejeitou a denúncia formulada em desfavor de uma mulher, pela prática do delito de preconceito racial, previsto no art. 20, § 2º, da Lei nº 7.716/89, ao fundamento de falta de justa causa para a ação penal (art. 395, III, do CPP).
Segundo a denúncia, a mulher, no dia 31 de outubro de 2014, incitou, na rede mundial de computadores, em seu perfil no Facebook discriminação ou preconceito de procedência nacional. Os dizeres postados pela mulher fazem agressão verbal a todas as pessoas que são nordestinas, usando palavras de baixo calão, e incita a segregação ao dizer “não venha (sic) para nosso estado”.
Em suas alegações recursais, o MPF sustenta que não deve prosperar o entendimento relativo à inexistência de demonstração do dolo e atipicidade da conduta, pois os elementos probatórios são firmes quanto à vontade livre e consciente de praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. O órgão ministerial sustenta ainda que a denúncia preenche os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal (CPP).
Para o relator do caso, juiz federal convocado Marcio Sá Araújo, a sentença recorrida merece reparos, pois o conjunto probatório produzido na fase indiciária deixou claro que a agressão verbal proferida pela mulher tinha cunho de discriminação e preconceito a pessoas nordestinas e incitou a segregação. Tais provas, obtidas na sua página pessoal do Facebook, que envolvem publicações de caráter discriminatório afastam a fundamentação da decisão recorrida. Para o magistrado, os dizeres da mulher propagaram seu sentimento “imbuído de severa ofensividade a uma coletividade – nordestinos -, transbordando o mero descontentamento político”.
O juiz federal asseverou que atribuir qualificações negativas genéricas a um grupo de pessoas atinge diretamente a dignidade ou respeitabilidade desse grupo perante a sociedade em geral, vez que tais palavras são ofensivas e revelam evidente dolo de discriminar, humilhar e desprezar, violando, por conseguinte, aquele que é um dos fundamentos basilares do Estado Democrático de Direito, o princípio da dignidade humana.
O relator salientou que há prova da materialidade e indícios suficientes no sentido de que a mulher, ao publicar a mensagem de cunho preconceituoso na sua página do Facebook, teve o nítido propósito de discriminar os nordestinos.
O Colegiado, acompanhando o voto do relator, deu provimento ao recurso para receber a denúncia e determinar o retorno dos autos à origem para o prosseguimento da ação penal.
Fonte: AASP